A LEI DO CONTEXTO
Ou, Leis Básicas de Interpretação da Bíblia
Pr. Davis W.
Huckabee

Citamos um exemplo para
mostrar a tolice disso, e embora poucas pessoas iriam ao extremo que o nosso
exemplo foi, mas algumas interpretações são totalmente perigosas por sua
plausibilidade aparente. Um pregador, que tinha uma séria aversão a mulheres
usando coque, determinou pregar uma mensagem contra esse costume. Mas não
conseguindo encontrar um texto que condenasse essa prática, ele escolheu quatro
palavras de Mateus 24:17, tirou-as de seu contexto e pregou sobre o tema
“Removendo o Coque”. A referência a essa passagem mostra que não há a referência
mais remota a cabelo, moda feminina, nem mesmo ao sexo feminino em alguma
maneira. No entanto, a passagem serviu para justificar o preconceito. E
lamentavelmente, às vezes tal tolice é ainda praticada por homens que se
preocupam mais com suas opiniões do que com a exposição correta da Palavra de
Deus.
Um dos fatores básicos
na Inspiração lida com esse assunto, conforme lemos em 2 Pedro 1:20-21: “Sabendo
primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular
interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum,
mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”. Observe-se
primeiramente que profecia aqui e em outras partes das Escrituras não se
restringe a eventos futuros que são preditos. A palavra grega propheteia
significa literalmente proclamar = pregar, e esse é o sentido mais
comum nas Escrituras quando essa palavra é usada.
Isso “significa a
proclamação da mente e conselho de Deus (pro, para frente, phemi,
falar: veja PROFETA)… Embora boa parte da profecia do Antigo Testamento seja
puramente de previsão, veja Miquéias 5:2, por exemplo, e confira João 11:51, a
profecia não é necessariamente, nem mesmo principalmente, prognosticadora. É uma
declaração daquilo que não se pode conhecer por meios naturais, Mateus 26:68, é
a proclamação da vontade de Deus, quer com referência ao passado, ao presente ou
ao futuro, veja Gênesis 20:7; Deuteronômio 18:18; Apocalipse 10:11; 11:3”. — W.
E. Vine, Expository Dictionary of New Testament Words (Dicionário
Expositor do Novo Testamento), Vol. III, P. 221.
Alguns sustentam de modo
errôneo que o versículo 20 proíbe qualquer indivíduo de decidir por si o que
alguma Escritura significa. Essa é principalmente a posição do catolicismo que
tem, até em tempos bem recentes, proibido seu povo de até ler a Bíblia, muito
menos determinar seu sentido, mas eles recebiam ordens de deixar a “Igreja”
decidir o sentido, e deixar a “Igreja” dizer ao povo no que crer. Contudo, esse
não é o sentido desse versículo, conforme a tradução literal revela.
Literalmente essa posição diz: “Nenhuma proclamação da Escritura é da sua
própria e livre interpretação”, e a razão é dada no versículo 21, “porque a
proclamação nunca foi produzida por vontade de homem algum”, etc. Deus deu as
Escrituras a Seus porta-vozes escolhidos, e Ele deve dar a interpretação delas.
Mas ao dizer que nenhuma Escritura é da sua própria e livre interpretação,
sugere-se que não se deve tirar nenhuma Escritura de seu contexto e
interpretá-la como se estivesse totalmente sozinha, sem nenhuma relevância para
quaisquer outras Escrituras. O contexto muitas vezes “desatará” o nó de algo que
de outro jeito seria impossível entender. O erro que muitas pessoas cometem é
não interpretar uma Escritura de acordo com seu contexto.
É fato que a maioria das
teorias prediletas baseia-se em perversões do verdadeiro sentido e
aplicabilidade do texto, pois as teorias que são sustentadas com mais tenacidade
e apresentadas com paixão, são geralmente as teorias com menos comprovação nas
Escrituras. Essa parece uma das fraquezas característica da carne — dar
importância maior ao que tem importância menor.
Pedro advertiu contra
esse próprio problema — torcer as Escrituras para tentar forçá-las a dizer o que
não dizem. Depois de falar das epístolas de Paulo, e das verdades profundas que
elas contém, ele disse: “…que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as
outras Escrituras, para sua própria perdição”. (2 Pedro 3:16) Deve-se observar
de passagem que Pedro foi inspirado a colocar as epístolas de Paulo no mesmo
nível das “outras Escrituras”. Isso também se aplicaria àquilo que o Espírito
Santo havia movido Pedro a escrever.
As palavras que Pedro
usou aqui são instrutivas. “Torcer” traduz strebloo, que é a forma verbal
de um substantivo que se referia a um instrumento de tortura, e assim se refere
à tortura com um sarilho, ou torcer até desconjuntar. É isso o que se tenta
fazer com uma Escritura quando se não quer entendê-la em seu contexto e deixá-la
dizer o que tinha o propósito de dizer. “Perdição” é o sentido literal da
palavra aqui usada, mas também é traduzida “destruição”, pois muitas vezes tem a
conotação de destruição espiritual. E essa é evidentemente a idéia aqui,
conforme indica o seguinte versículo: “Vós, portanto [ele está tirando
uma conclusão a partir do versículo precedente], amados, sabendo isto de
antemão, guardai-vos de que, pelo engano dos homens abomináveis, sejais
juntamente arrebatados, e descaiais da vossa firmeza”. Perverter uma
Escritura a fim de se estabelecer uma interpretação pessoal é uma característica
dos homens maus, e tem sua própria maldição, pois entorta o entendimento que o
indivíduo tem da verdade e estabelece a falsidade em seus pensamentos. Mas os
verdadeiros santos podem também se desviar nesse assunto, pois todos temos ainda
uma mente carnal que deve ser mantida em submissão ao Espírito Santo.
Lendo o contexto, logo
ficamos sabendo que o assunto que está sendo discutido aqui não é a “vida
intermediária”, nem é de forma alguma o estado da alma que está em debate. O
apóstolo está aqui argumentando que Jesus na verdade era o que Ele afirmava ser,
e que o Pentecoste era prova do fato de que Jesus realmente havia ressuscitado
dos mortos e subido fisicamente ao Pai, conforme já havia sido predito em
profecia. A ressurreição física de Cristo é o assunto aqui, pois Davi não
havia subido fisicamente ao céu, de modo que a profecia não poderia se referir a
ele. Um conceito pré-formado envolvendo a teoria do estado intermediário
permaneceu com esse escritor durante três ou quatro anos, impedindo-o de
entender corretamente essa maravilhosa passagem, mas quando ele a leu em
contexto, a verdade finalmente irrompeu. Isso fez com que esse escritor ficasse
mais consciente da necessidade de observar o contexto inteiro em qualquer
passagem antes de aplicar sobre ela alguma interpretação dogmática. Desde então,
com o passar dos anos escrevendo comentários acerca de quase todos os versículos
do Novo Testamento, esse escritor constatou repetidamente que entender dentro do
contexto inteiro quase sempre nos dá uma percepção mais reta de qualquer
versículo.
A pregação expositiva
era o tipo mais comum achado no Novo Testamento, e é claro que essa pregação
envolve pegar uma parte das Escrituras e examiná-la, em vez de pegar só um texto
ou tópico e desenvolver uma mensagem em torno dele. Por esse motivo, a pregação
expositiva geralmente lida com uma parte maior das Escrituras do que lida com
qualquer outra forma de pregação, e é pois mais fiel ao contexto de qualquer
dado versículo do que qualquer outra forma de pregação. Assim essa pareceria ser
a forma ideal de pregar a Palavra. No entanto, a pregação tópica e textual é
também importante e muitas vezes necessária, mas devemos sempre considerar o
contexto.
Mas podemos e devemos
aplicar para todo o nosso estudo esse mesmo princípio e sempre fazer questão de
estudar o contexto inteiro de qualquer versículo, até mesmo quando envolve
vários capítulos. E todo o nosso esforço impedirá a aplicação de uma
interpretação errônea num versículo isolado. O evangelismo popular que usa
“Caminhando em Romanos” erra nesse aspecto, pois pega Romanos 10:13 e constrói
uma pirâmide invertida em cima desse único versículo, com pouca ou nenhuma
atenção ao contexto. É gloriosamente verdade que “Quem invocar o nome do Senhor
será salvo”. Mas há nove capítulos e meio de contexto antes desse versículo que
precisamos entender para que não lhe apliquemos uma interpretação totalmente
errônea. A negligência de levar em consideração os capítulos de um a três de
Romanos deixará os homens ignorantes da depravação total de todos os homens de
modo que eles não perceberão sua necessidade. E sem conhecimento de Romanos
3:24-5:1 os homens permanecem ignorantes da necessidade absoluta da redenção que
existe única e completamente em Cristo. E se os homens não perceberem que essa
redenção é aplicada unicamente pela graça soberana, Romanos 5:20-21, eles
sentirão uma auto-suficiência que os impossibilitará de sentir a necessidade de
invocar o Senhor. É fácil obter profissões de fé se um Evangelho pervertido e
incompleto for apresentado, mas a negligência de apresentar toda a verdade
condenará o pecador para sempre, e fará com que o pregador descuidado seja
culpado do sangue dos homens, Atos 20:26-27.
O contexto determinará,
na maioria dos casos, o assunto de qualquer versículo, pois há geralmente um
discurso conectado. A única exceção é o Livro de Provérbios que, conforme seu
título sugere, é uma coleção de ditados curtos sobre muitos assuntos. Contudo,
até mesmo em Provérbios há às vezes uma continuidade de assunto através de
vários versículos ou, num exemplo, vários capítulos (o assunto de “Sabedoria” é
bem proeminente em vários capítulos).
As Leis até agora
consideradas estão todas inter-relacionadas, pois a Lei Um diz: “Deus deu uma
revelação?” A Lei Dois pergunta: “Sou submisso à revelação de Deus?” Então a Lei
Três pergunta: “Qual é o sentido dos termos usados?” A Lei Quatro então
pergunta: “Quais as maneiras em que os termos são usados?” A Lei Cinco pergunta:
“Quais a leis gramaticais que governam os termos usados?” Enquanto a Lei Seis
pergunta: “Qual é o assunto do contexto em que está esse versículo?” Tudo isso é
muito importante na hora de determinar a interpretação correta das Escrituras, e
onde essas leis são ignoradas ou violadas, não dá para evitar erro e
interpretações incorretas das Escrituras.
Todos os cristãos
precisam se preocupar com a interpretação correta da Palavra da Verdade, não só
por amor a si, pois todos devemos algum dia “comparecer ante o tribunal de
Cristo”. (2 Coríntios 5:10), para dar “conta de si mesmo a Deus” (Romanos
14:12), mas por amor aos outros também. Nós todos temos influência sobre outros,
quer queiramos ou não, e por esse motivo devemos ser sãos na fé, do contrário
desencaminharemos outros. O erro doutrinário na vida de uma pessoa pode não ter
conseqüências tão sérias quanto tem em outros que seguem o exemplo dessa pessoa,
pois ela pode ter outras crenças que são sadias o suficiente para impedi-la de
se aprofundar no erro. Mas pode ser que seus seguidores não tenham essas
verdades para contrabalançar, e assim sejam mais ainda desencaminhados.
Autor: Pr Davis W Huckabee
Fonte: www.obreiroaprovado.com
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